quarta-feira, 19 de agosto de 2009

AS COLEGIAIS



Agachadas como quem nos fita,
do adro da ampla e bela mesquita,
as crianças repetiam os versículos ---
do livro sagrado da lei escrita.

lembrar-se-ão elas de fronte aflita,
que mais tarde surge a coisa infinita,
ou pensarão que Mahma lhes envia ---
figos e neve a depor na bela cripta?

Lisboa, 18.5.06

O MERCADOR DE PERFUMES


Tu pretendes que Karum e Balkis à instantes,
não possuíam os perfumes mais inebriantes,
e suaves que os teus; ou que os jardins de Marib ---
não exalam nunca os odores mais penetrantes.

não conheci Marib nem Balkis nem nada,
nem nunca atravessei sem dor apagada,
os jardins de Marib; mas digo-te que já ---
respirei o perfume da minha bem amada.

neste momento está de alma velada,
e bebe do Kaussaé a água sagrada;
porque a minha amada voltou a Deus ---
e a procuro no perfume da flor adocicada.

perguntei por ti a todos eles de ferida aberta,
aos ventos do sul e do norte que tudo liberta,
se pelos oásis acariciaram flores mais alvas ---
ou nas montanhas houve essa descoberta.

pedi-o ao hálito da primavera todo prostrado,
mas o hálito da primavera nunca nos é dado,
e mesmo assim não trazia aroma bastante ---
porque o vento do norte não a havia acariciado.

pois os seios da minha bem amada são pulsantes,
e nem os ventos e eu mais se enrolam sibilantes,
em sua cabeleira; não me mostres pois ó mercador ---
esses teus vidros de perfumes tão estonteantes!

Lisboa, 24.01.08

A INSCRIÇÃO


a que foi minha Daulah repousa aqui;
foi no mês de Djemazi – el – Akhir,
na funesta terceira noite que morreu ---
do mês das flores em que muito sofri.

nós dois a amávamos como medrosos,
pois seus lábios eram muito saborosos;
sua alma era terna para todos nós ---
com todos aqueles sorrisos amistosos.

se o seu nome te recorda muito bem,
pois talvez tu a acariciaste também,
evoca pelos dois esta felicidade antiga ---
pois o sono dos mortos é despido de desdém!

Lisboa, 24.01.08



terça-feira, 21 de julho de 2009

A CULPA DAS ROSAS



Paremos pois quero me sentar,
sob esta árvore e poder cismar;
onde um dia à sombra estivemos ---
num encontro a dois a palpitar.

muitas vezes recitarei,
a ti que muito te amei,
o poema de Faldl – el – Hagiri ---
(aquele que te murmurei):

“ela tem toda a flexibilidade,
do ramo que verga com intensidade,
e o seu olhar dá a embriaguez ---
do vinho da santidade.

por causa disso meu coração,
ficou prisioneiro desde então,
e se passar uma adolescente ---
recordar-me-ei dela com emoção.

só poderá ser feliz e viva,
quem na boca fez da saliva,
a bebida de suas manhãs ---
e nas noites foi toda altiva!...”

muito tempo depois cheio de tremor,
nos encontramos outra vez com pudor;
e aos seus joelhos as rosas que havia atirado ---
nesse dia voltaram a falar do nosso amor.

ah! aquela nossa grande felicidade,
foi tão rápida e ligeira na imensidade,
de uma noite qualquer da Primavera ---
(oh tu!, sempre cheia de boa vontade!).

não devias tu guarnecer essa tua cintura,
com rosas do terraço cheias de frescura,
se penso em ti recordo-me deste poema ---
de Faldl - el – Hagiri como de uma cura!

Lisboa, 5.06.06

A SABEDORIA



Ela é uma seda roxa que assombra,
quando a vi na areia a sua sombra,
e lhe pedi então que se afastasse ---
para a poder beijar na penumbra.

ela respondeu-me com tamanha placidez,
que não era mais do que sombra sem nitidez,
pois era uma sombra de mulher na areia!...
(assim falou ela para mim cheia de timidez).

uma sombra respondi-lhe por minha vez,
mas da mulher que amava com embriaguez,
cujos lábios não podia de outro modo beijar ---
então que me deixasse beijar sua altivez.

a sombra do seu corpo deitado me embalou,
e conservava a sua tepidez quando ela falou:
esta areia é menos tépida que os meus lábios ---
portanto só beijarias a areia que te inflamou!

vem beijar-me os lábios meu bem - amado!
mas eu lembro-me de que parti com agrado,
sem mesmo ter beijado aqueles seus lábios ---
pois não desejava mais esse oiro imaculado...

Lisboa, 2.06.06

RAMOS DE FLORES



Sélima fazia um lindo ramo todo inteiro,
com as flores do grande pessegueiro,
quando um velho que passava lhe disse ---
se ignorava os aromas do santo padroeiro.

que as flores em frutos iriam cair à sua beira;
mas dias depois quando estava à lareira,
percebeu que no jardim estava o velho ---
e que colhia para Zarifah galhos de macieira.

- o quê disse-lhe Sélima por sua vez,
ignoras que essas flores em sua mudez,
se iriam transformar também em frutos? ---
duvido disse o velho na sua embriaguez.

o jardineiro afirmou mesmo desolado,
que durante a noite cairá no povoado,
uma geada forte ou teria ela adivinhado ---
que Zarifah era bela e de rosto velado ?...

Lisboa, 2.06.06




terça-feira, 23 de junho de 2009

A HORA TRANQUILA



Eis a hora tranquila tão desejada,
em que os rebanhos pela estrada,
se encaminham todos para o poço ---
quando o dia esmorece e és beijada.

estendido eu espero pela bem amada,
nestes coxins de forma arredondada,
que guardam a impressão do seu corpo ---
e que marcam esta hora por si inspirada.

já coloquei na janela escancarada,
um vaso onde está toda mergulhada,
a haste de uma rosa; e lá no cume da ---
colina azul tu destacas-te iluminada.

Lisboa, 23.06.09